Carta do Gestor Set/23
Cenários e perspectivas
1. Cenário Econômico
Nos EUA as atenções estão voltadas para a escalada dos juros. Em junho de 2023, os títulos com vencimento para 10 anos, eram negociados a taxa de 3,6% a.a. e, hoje (9/10), as negociações giram em torno de 4,7% a.a. Como consequência, as vendas de residências novas sofreram uma queda de 8,7%, afetadas pelo recente aumento nas taxas de hipoteca. A taxa de juros para hipotecas fixas de 30 anos superou a marca de 7,0% a.a., atingindo o mais alto patamar desde 2001.
Essa elevação nas taxas está correlacionada a deterioração do déficit público norteamericano, marcado por novas emissões de títulos de longo prazo com taxas maiores, cujo objetivo é a recomposição da liquidez do FED. Cabe lembrar que, no mês de agosto, o Tesouro anunciou que as necessidades de empréstimo do país para o 3° trimestre seriam superiores ao inicialmente previsto, ultrapassando a marca de US$ 1 trilhão, cerca de 37% acima da projeção anterior de U$ 733 bilhões.
O déficit nos nove meses atingiu US$ 1,4 trilhão, registrando aumento substancial de 170%, se comparado com o mesmo período do ano anterior. Os gastos do governo chegaram a US$ 4,8 trilhões (out/22 e jun/23), com impostos arrecadados de US$ 3,4 trilhões. Desta forma, os agentes de mercado precificam o descompasso entre receitas e despesas. Nesse contexto, os Deputados dos EUA promoveram o impeachment do presidente da Câmara Kevin McCarthy, sob a alegação que houve negligência quanto à flexibilização do mecanismo que limita a dívida do país, ocorrida em votação no Congresso em 31/5/23. O Teto do Gasto do país de US$ 31,4 trilhões foi atingido em janeiro/23, sendo que em setembro/23 a dívida chegou ao recorde histórico de US$ 33,0 trilhões. Novas negociações deverão ocorrer em 17/11/2023, com a promessa, por parte dos Republicanos, de exigir maior austeridade por parte do Governo. Adicionalmente, a atividade econômica continua aquecida, registrando maior renda e maior consumo, sinalizando pressão inflacionária. No momento, 85,9% dos players apostam na manutenção da taxa de juros em 5,25% a.a. e 5,50% a.a., entretanto é o suficiente para o agravamento da crise fiscal.
O mercado foi surpreendido (6/10) com os dados divulgados por meio do Payroll (não-agrícola), indicando a geração de 336 mil empregados em setembro ante o projetado de 170 mil empregos, reforçando a necessidade de manutenção da taxa de juros em patamares altos por um longo período. Segundo nosso Relatório de Conjuntura, na Zona do Euro a inflação apresentou uma queda significativa em setembro, atingindo a marca de 4,3%. Esse declínio representou uma redução notável de 0,9 ponto percentual em relação à taxa registrada em agosto, que estava em 5,2%. É relevante destacar que, apesar dessa queda, a inflação ainda permanece acima da meta de 2% estabelecida pelo Banco Central Europeu. O valor registrado no mês de setembro é o mais baixo desde outubro de 2021, quando havia atingido 4,1%. Posto isso, o Banco Central aumentou as taxas de juros em 0,25 ponto percentual, a 4,0% a.a., nível mais alto desde o lançamento do euro, em 1999. Ao mesmo tempo, foi sugerida uma pausa no ciclo de aperto monetário para trazer os aumentos de preços de volta ao seu objetivo de 2%. Com base na sua avaliação, as taxas de juro atingiram níveis que, mantidos por um período longo, contribuirão substancialmente para o regresso atempado da inflação à meta.
Com relação à China, o crescimento menor é justificado por questões estruturais, contudo as medidas anticíclicas, implementadas por parte Governo poderão atenuar o baixo crescimento global, contribuído para a manutenção das exportações brasileiras. Quanto ao conflito entre a Palestina e o Estado de Israel, o maior impacto registrado foi o aumento do preço das commodities energéticas. O Brent e o WTI registraram (9/10) 4,23% e 4,37% de alta respectivamente. Uma preocupação adicional, é a possibilidade de envolvimento do Irã no conflito, aumentando as tensões no Oriente Médio, dado que os EUA intensificaram seu apoio a Israel. Com maior pressão sobre os preços do petróleo, o controle inflacionário, pós-Covid, estaria parcialmente comprometido, contribuindo para maiores juros e menor crescimento global.
No Brasil, o destaque ficou para a resiliência da atividade econômica, explicada pela pujança do setor agrícola. Vale registrar que a taxa de desocupação melhorou e encontra-se em 7,9%, contribuindo para uma melhor marginal do consumo. Não obstante, o resultado das contas públicas não está a contento. O relatório do Tesouro Nacional (ago/23) registrou queda na arrecadação e aumento das despesas, impeditivo para a aceleração da queda da Taxa da Selic. Hoje, a Selic é de 12,75% a.a., com previsão de chegar a 11,75% a.a. ao final do ano.
O IBGE reportou inflação (IPC-A) de 0,23% em agosto e o acumulado nos últimos 12 meses é de 4.61%. Já o IPCA acumulado no ano de 2023 até o momento é de 3,23% e o IPCA ante o acumulado de 2022 em 5.78%. Já o IPCA-15 de setembro registrou 0,35% a.m. contra 0,28% a.m. em agosto, mostrando alguma deterioração. As projeções para 2023 apontam para um IPC-A a 4,86 a.a., taxa de câmbio a R$ 5,00 reais.
Do lado fiscal, a dívida bruta a 74,5% do PIB e a líquida a 60,5% do PIB, sendo que o déficit primário deverá ficar em -1,1% do PIB e o nominal em -7,4% do PIB. Com relação às projeções para 2024, os desafios ficam por conta dos gastos públicos, da taxa de câmbio acima de R$ 5,00 e a maior pressão sobre os combustíveis, em razão da guerra deflagrada entre Palestina e Israel. Esses elementos poderão tirar a inflação da sua trajetória em direção a meta de 3,25% a.a.
2. Estratégia das Carteiras
Com base no cenário desafiador, seguimos com maior exposição na renda fixa por meio dos títulos pré-fixados de curto prazo, favorecidos pelo início do ciclo de queda da taxa de juros. O processo de aumento marginal das posições em ações foi interrompido, considerando as circunstâncias exógenas.
2.1 Renda Fixa
A intensificação das posições em títulos pré-fixados a partir do mês de março, com baixíssimo risco de crédito e de curta duração, tendem a surtir efeito significativo, devido ao ciclo de queda da taxa Selic. A estratégia de alocação no curto prazo segue, em razão do cenário adverso.
2.2 Renda Variável
Em setembro interrompemos o processo de maior exposição em bolsa de valores. De forma complementar, contratamos uma proteção (BTC BOVA11), devido, principalmente, à deterioração do cenário internacional (juros nos EUA). Nossas alocações permanecem privilegiando os setores mais resilientes, justificada pela pressão nos preços das commodities, em especial agrícolas, energia elétrica, petróleo e minério de ferro.
2.3 Carteira internacional
Manutenção da estratégia de aquisição dos bonds de empresas norte-americanas com rating acima “BBB” e com duration abaixo de 5 anos, devido ao cenário adverso. Em face do risco associado à elevação da taxa de juros nos EUA, mantivemos aplicações relevantes nos títulos do tesouro de curto prazo de alta liquidez (Bil), configurando como recursos estratégicos para um eventual stress de mercado. Quanto à renda variável, seguimos investindo com critérios fundamentalistas privilegiando as empresas com forte estrutura de capital e geração de riqueza relevante (ROE e ROIC).
3. Conclusão
O cenário internacional tornou-se ainda mais desafiador com o início da guerra entre Palestina e Israel, sendo seu desdobramento incerto até o momento. A possível aliança entre o Hamas, o Hezbollah e o Irã, dificulta a mensuração da amplitude do conflito e seus impactos. Hoje, os ataques estão concentrados na faixa de Gaza, cabendo monitoramento contínuo. A gestão segue priorizando a preservação de capital e o rigoroso controle de riscos.
A disciplina na busca por ativos de qualidade com fundamentos fortes encontra-se preservada.
Renan S. Silva
Gestor, CGA