Carta do Gestor Jul/23
Cenários e perspectivas
1. Cenário Econômico
Nos EUA a possibilidade de uma recessão técnica está cada vez mais distante, em razão dos indicadores econômicos que apontam para um “pouso leve” em 2024. Mesmo tendo apresentado crescimento econômico lento e gradual, a atividade deverá registrar um incremento de 2% em 2023, de 0,7% em 2024 e de 1,8% em 2025. Por outro lado, foram revisadas as expectativas de desaceleração da inflação, indicando estagnação, justificada pela atividade econômica resiliente e o pleno emprego. No cômputo, as projeções para 2023 encontram-se inalteradas na ordem de 3,5%, contudo, as de 2024 e 2025 foram elevadas para 2,8% e 2,2% respectivamente. Nesse contexto, passado o risco de uma crise bancária mais intensa, o Banco Central norte-americano elevou a taxa de juros em 0,25% (26/7), atingindo o patamar de 5,5% a.a., recorde dos últimos 22 anos, sinalizando pela continuidade do ciclo de aperto
monetário em linha com as expectativas de mercado. Não obstante, os mercados globais foram surpreendidos pelo rebaixamento dos EUA anunciado pela agência Fitch Rating (1/8), que reduziu a classificação de risco soberano de “AAA” para “AA+” com perspectiva estável.
Em nota, a Ficth declarou que a mudança reflete a expectativa de deterioração fiscal, referindo-se às discussões políticas que permearam o aumento do limite da dívida aprovado pelo Congresso com grande atraso (jun/23), potencializando o risco de futuros impasses a frente. Complementarmente, alertamos para o maior custo da dívida, sensível a elevação dos juros e o grau de endividamento no patamar de 136%/PIB. O estopim teria ocorrido no dia 31/7 quando o Tesouro divulgou sua estimativa de necessidade de financiamento de US$ 733 bilhões para US$ 1,0 trilhão, bem acima do esperado pelos analistas. Na prática, o mercado foi a compra dos bonds norteamericanos com forte desconto nos preços e taxas mais elevadas, sendo que há um mês o vértice de 30y apresentava taxa de 3,85% a.a. e agora chega a 4,29% a.a. Consequentemente, a Nasdaq e a Nyse, caíram (2/8) em reação ao rebaixamento, com
desvalorizações de 2,50% e 1,03%, respectivamente. Na Europa, o índice Stoxx 600 também acumulava perdas, de 1,35%. Já o Ibovespa teve seu desempenho prejudicado em 0,75% naquele dia. Apesar das tensões, o Relatório de Emprego Não-Agrícola (“Payroll”) auferiu uma geração de 187 mil novas vagas (jul/23), abaixo das 200 mil vagas projetadas, descartando, por hora, nova aceleração dos juros nos EUA.
Na Zona do Euro o cenário permanece inalterado. Após a taxa de juros atingir os 3,5% a.a., máxima dos últimos 22 anos, o BCE sinaliza para mais aumentos de juros, ampliando o combate à inflação mesmo com o enfraquecimento da economia na região. A perspectiva é que as taxas sejam elevadas para níveis restritivos a ponto de alcançar a meta inflacionária de 2%, corroborando com menor demanda por insumos para o setor manufatureiro e maior compressão sobre os preços das commodities. Na mesma linha, O Banco da Inglaterra aumentou (3/8) os juros em 0,25%, atingindo a taxa de 5,25% a.a. É a 14ª alta consecutiva, com o objetivo de a inflação convergir para a meta de 2%. O índice de preços ao consumidor ficou aquém das projeções, registrando 7,9% no acumulado de 12 meses até junho.
O Japão voltou a cena global em face do novo posicionamento por parte do BoJ (Banco Central japonês), objetivando controle da curva de juros com maior flexibilidade. O movimento ocorre quando a inflação no Japão se torna mais resiliente do que o esperado. O banco central projetou que o índice de preços ao consumidor aumentará 2,5% durante o ano fiscal encerrado (31/3/24), ante 1,8% projetado anteriormente. Ainda, o núcleo da inflação do Japão atingiu 3,3% em junho, sendo esse, o 15º mês consecutivo acima da meta de inflação de 2%.
Quanto a China, o PBoC (Banco Popular da China) manteve a taxa juros para linha de crédito de médio prazo em 2,65% a.a., apesar do desempenho mais fraco da economia após a decretação do fim do “lockdown”. Simultaneamente, verificamos uma injeção de US$ 14,42 milhões na forma de liquidez para o sistema financeiro por parte da autoridade monetária. Desta forma, uma ala do mercado financeiro projeta crescimento de 5,4% em 2023 para a economia chinesa, maior parceiro comercial do Brasil.
No Brasil, os principais indicadores de inflação apresentaram deflação em junho, denotando menor atividade, com destaque para o IPCA na ordem de -0,08%, sendo que o acumulado em 12 meses registrou 3,16%, abaixo da meta inflacionária determinada pelo CMN que é de 3,25% a.a. para 2023. Os fatores combinados como a deflação, a queda dos preços das commodities, o arrefecimento da taxa de câmbio, associados a produção industrial fraca, a retração
das vendas no varejo e o menor volume de serviços, foram decisivos para a decisão do Copom em reduzir a Taxa Básica Selic para o patamar de 13,25% a.a., indicando o início do ciclo de queda dos juros no Brasil. Como consequência observamos o deslocamento para baixo da curva de juros futura. O contrato DI1F25 (jan/25) passou a ser negociado a 10,15% a.a., contribuindo para manutenção do Ibovespa ligeiramente acima dos 120.000 pontos.
Do lado do Governo, o resultado primário atingiu -0,24% do PIB e o resultado nominal, que incluem as despesas com juros, chegou a -6,42% do PIB. Quanto a dívida bruta e a dívida líquida, há uma crescente deterioração, tendo atingido os 73,6% do PIB e os 59,0% do PIB respectivamente. Essa tendencia pode ser desconstruída a partir dos
efeitos esperados com a aplicação do novo Arcabouço Fiscal, tramitando no Congresso Nacional, e da Reforma Tributária, tramitando no Senado Federal.
2. Estratégia das Carteiras
No curto prazo, promovemos a manutenção da estratégia de maior exposição aos títulos pré-fixados, favorecidos pelo início do ciclo de queda da taxa de juros no Brasil, e em ações de empresas listadas em bolsa de valores com atuação no mercado doméstico, considerando a retração econômica global, aliada a menor taxa de câmbio.
Entretanto não foram descartados os pontos de atenção quanto ao risco fiscal, cabendo monitoramento constante.
No longo prazo permanecem as dúvidas sobre a aplicabilidade do Arcabouço Fiscal e os possíveis impactos da Reforma Tributária, principalmente nos setores agrícola (7% do PIB) e de serviços (70% do PIB), o que justifica o maior rigor na análise de crédito e as alocações com duração menor do que 4 anos.
2.1 Renda Fixa
A intensificação das posições em títulos pré-fixados a partir do mês de março, com baixíssimo risco de crédito e de curta duração, deverão surtir efeito significativo a partir do corte da taxa Selic, onde pretendemos auferir ganhos de marcação a mercado, advindos da valorização de nossos papeis em carteira.
2.2 Renda Variável
Igualmente, mantivemos a maior exposição em bolsa de valores iniciada no mês de março. As novas alocações privilegiam os setores da economia doméstica mais sensíveis a queda da Taxa Selic. A redução da exposição no setor de exportação foi assertiva, dado o cenário externo conturbado. Nessa linha, aportamos os recursos do caixa no setor de varejo, alta renda e atacadões, e no setor imobiliário de alta renda. Mantivemos as posições nos setores essenciais, altamente correlacionados ao crescimento do PIB e no setor agrícola, em especial, sementeiras e silos, beneficiados pelo Plano Agrícola (2023).
a. Carteira internacional
Essencialmente, foram adquiridos bonds de empresas norte-americanas, financeiras e não-financeiras, com rating acima “BBB” e com duration abaixo de 5 anos, devido ao cenário adverso com elevação dos juros e rebaixamento dos EUA. Adicionalmente, adquirimos bonds de empresas brasileiras com risco de crédito baixo, com vistas a otimizar os resultados de renda fixa, dado que nossas empresas oferecem maiores prêmios.
Em face do risco associado a elevação da taxa de juros nos EUA, mantivemos aplicações relevantes nos títulos do tesouro de curto prazo de alta liquidez (Bil). Esses recursos são estratégicos para um eventual stress de mercado, cuja função é a de correção de rota frete a períodos de alta volatilidade. A respeito da renda variável, o segmento permanece performando bem nos EUA alicerçado no pleno emprego e na baixa alavancagem das famílias estadunidenses. Seguimos critérios fundamentalistas de longo prazo na seleção das empresas mantendo a qualidade da alocação. Por exemplo, a BERKSHIRE HATHAWAY INC, o BANK NEW YORK MELLON CORP, o JPMORGAN CHASE & CO COM entre outras corporações com forte estrutura de capital.
3. Conclusão
O cenário internacional ganha mais contornos de complexidade com os países desenvolvidos intensificando o combate a inflação em meio ao menor crescimento e ao aumento das tensões no campo geopolítico. Nesse contexto, continuamos com o ímpeto de capturar os benefícios do início do ciclo de queda de juros no Brasil, também, aproveitando o maior fluxo de capitais oriundos da melhora da nota de classificação do risco soberano brasileiro de “BB-“para “BB”, emitida pela agencia Ficth Ratings. Cabe reforçar que a melhora observada das condições do mercado doméstico, tem caráter de curto, sendo que a gestão segue priorizando a preservação de capital e o rigoroso controle de riscos. A disciplina na busca por ativos de qualidade com fundamentos fortes encontra-se preservada.
Renan S. Silva Jr
Gestor, CGA