Carta do Gestor jul/ago – 2024
Cenários e perspectivas
EUA
Em julho os dados de alta frequência nos EUA agradaram os agentes de mercado, com destaque para os dados dos pedidos de acesso ao seguro-desemprego. No início do ano eram 1,5 milhão de trabalhadores inscritos no seguro-desemprego e hoje (12/8) somam 1,8 milhão. Na prática, aumenta a probabilidade de o FOMC iniciar o ciclo de corte de juros nos EUA, atualmente entre 5,25% a.a. e 5,50% a.a.. A expectativa é de um primeiro corte de 0,25%, o que poderá estimular a imigração do fluxo de capital para os países emergentes.
Conforme monitoramento, é clara a posição do FOMC em controlar a inflação e ao mesmo tempo manter a atividade econômica robusta, tarefa nada fácil, entretanto, os riscos de uma retração estão ampliados no momento, reforçando a tese de afrouxamento monetário. Corroborando com esse sentimento, os índices de bolsa fecharam firmemente em alta na quinta-feira (8/8), com o Dow Jones Industrial Average subindo praticamente 700 pontos, ou 1,8%, enquanto o S&P 500 saltou 2,3%, sua melhor sessão desde 2022.
Zona do Euro
Na Zona do Euro a economia cresce acima do esperado, tendo registrado 0,3% no 2T24. No cômputo prevalece o maior pessimismo com relação a continuidade do crescimento, dado que a economia alemã surpreendeu com retração na produção industrial. Vale esclarecer que as empresas alemãs sofrem com a perda marginal de competitividade e a população sente a queda no poder de compra. A justificativa é a ruptura de seu modelo de negócios baseado na energia barata advinda da Rússia e da redução do comércio com a China.
As economias da França, da Espanha e da Itália, registaram melhores resultados, mas ainda contagiados parcialmente por gastos governamentais. Nesse contexto, o BCE deverá manter o ímpeto de cortar a taxa de juros na região, hoje no patamar de 3,75% a.a.
China
A economia da China ainda se apoia na manufatura para sustentar seu crescimento e os dados divulgados indicam fragilidade, em razão da redução do consumo doméstico. Não obstante, as exportações apontaram para um fortalecimento em julho, sendo que no primeiro semestre o volume de cargas despachadas dos portos chineses aumentou 8,5% em comparação com 2023, com as tarifas de frete de contêineres quadruplicando, conforme o índice de fretes marítimos NCFI.
Os indicadores industriais têm mostrado volatilidade com redução na atividade geral das fábricas, segundo o índice Caixin cuja ênfase nas empresas privadas e exportadoras houve contração inesperada pela primeira vez em nove meses, um sinal preocupante, especialmente porque o Produto Interno Bruto (PIB) da China no segundo trimestre já havia ficado aquém das expectativas, crescendo 4,7% em vez dos 5,1% previstos pelos economistas. Os preços ao produtor caíram pelo 22º mês consecutivo e os economistas revisaram para baixo suas previsões de crescimento para a China este ano, de 5% para 4,8%. Além da redução inusitada da taxa de juros (LPR) de 3,45% a.a. para 3,35% a.a., em resposta às preocupações econômicas, o governo chinês anunciou um pacote de medidas para impulsionar o consumo. As medidas visam explorar o potencial de expansão do consumo em setores como alimentação, serviços domésticos e cuidados com idosos. Também haverá estímulos às novas formas de consumo, como lojas de autoatendimento, lockers de retirada de compras, ao desenvolvimento de esportes eletrônicos e de vendas no e-commerce.
Japão
O Banco Central japonês elevou (31/7) de forma inesperada a taxa de juros de curto prazo para 0,25%, tornando-a positiva pela primeira vez em de 8 anos. Essa mudança de postura por parte da autoridade monetária provocou um ajuste no Índice Nikkei (bolsa de valores) de -12% em um único pregão, devido as preocupações quanto ao grau de endividamento do Governo. A dívida bruta do país encontra-se em 252% do PIB e a dívida líquida representa 158% do PIB, sendo que, por menor que seja a elevação dos juros, a relação dívida/PIB deverá deteriorar rapidamente.
Da mesma forma as despesas financeiras das empresas japonesas estarão sob pressão, uma vez que as empresas estão altamente alavancadas, em razão das taxas de juros negativas praticadas por quase uma década pelo BoJ, as quais motivaram a captação de recursos. Sem dúvidas o novo cenário para a economia foi o protagonista no decorrer mês, contagiando parcialmente os mercados globais, preocupados com a relevância do país, o qual figura como quarta economia global muito próxima da economia alemã que é a terceira, denotando ponto de atenção.
Cenário Econômico Doméstico
No Brasil, prevalece a insegurança quanto a condução da Política Fiscal, pressionada principalmente pela indexação das despesas previdenciárias e administrativas. Como consequência, as projeções para a inflação encontram-se em torno de 4,20% para 2024, o que motivou o Copom/Bacen a manter a taxa Selic na ordem de 10,5% a.a., ainda muito elevada. Os agentes de mercado apontam para o risco de a taxa básica permanecer igual no decorrer de 2025, inibindo o crescimento da atividade.
As perspectivas de queda de juros nos EUA, a partir de setembro do ano corrente, trouxeram animo para a bolsa de valores brasileira, a qual apresenta forte desconto. O P/L médio da bolsa brasileira gira em torno de 11 anos, tendo alcançado 20 anos na primeira década dos anos 2000. Hoje (12/8), o P/L médio da bolsa de valores é de 9 anos. Do dia 1/7 até o momento (12/8), o Ibovespa subiu dos 125.300 pts. para 130.600 pts., valorização de 4,2% no período sendo que no semestre são 6,0% de valorização. Para tanto, o fluxo de capital estrangeiro que representa 55% do volume da bolsa brasileira retornou parcialmente, comprimindo a taxa de câmbio de USD/BRL 5,82 para UDS/BRL 5,49 (12/8).
No radar dos analistas está a Reforma Tributária tramitando no Congresso nesta semana (12/8 a 16/8) e, com toda a controvérsia em torno do tema, a perspectiva é de algum ganho no campo da simplificação e do aumento da arrecadação.
Geopolítica
Verificamos forte acirramento do conflito entre Israel e a Palestina e a sua expansão para Líbano e o Irã. O conflito no Oriente Médio entrou em uma nova escalada desde a morte do líder do Hamas, Ismail Haniyeh. Aliados do grupo extremista acusam diretamente Israel e o Irã e o Hezbollah prometeram revidar o ataque. Os iranianos consideram um ataque combinado de drones e mísseis contra alvos militares próximos à Tel Aviv e Haifa, sendo que a estratégia inclui a coordenação com aliados do Iêmen, da Síria e do Iraque.
A crescente tensão na região e uma eventual resposta que bloqueie o estreito de Ormuz pode escalar a crise para outras regiões. O estreito conecta o Irã à península arábica, por onde passa 30% do petróleo global, o que poderia levar ao aumento do preço do petróleo, podendo interromper o início do ciclo de queda dos juros nos EUA e atrasando a retomada da atividade econômica.
Ademais, observamos o aumento das tensões entre a Rússia e Ucrânia, dois países produtores de commodities de grande relevância, como é o caso do gás, do petróleo, do carvão, do trigo, da uréia etc. Ou seja, mais preocupações quanto a possíveis choque de custos para as nações.
Estratégia das Carteiras
Carteira de Renda Fixa
Ainda prevalecem as aquisições de títulos pós-fixados de emissões privadas aproveitando maiores prêmios, contudo mantendo a diversificação nos títulos pré-fixados e indexados na inflação em menor grau, justificada pelo elevado grau de incerteza advinda da conjuntura econômica e geopolítica.
No segundo semestre, os vencimentos de títulos serão realocados parcialmente, na ordem de no máximo 10%, em títulos de crédito privado, aproveitando o “fechamento” da curva de juros futura afetada positivamente pela perspectiva de corte de juros nos EUA. Cabe reforçar que a duration dos novos títulos não deverá ultrapassar 4 anos e será mantido o rigor na análise de crédito.
Carteira de Renda Variável
Em razão do cenário de curto prazo, alicerçado na possível queda dos juros nos EUA a partir de setembro, estamos redirecionando a carteira para um Beta (b) mais elevado, ou seja, papéis de empresas com bons fundamentos, com maior aderência ao Ibovespa, aqueles mais demandados pelo capital estrangeiro, onde a preferência pela liquidez tem relevância. São ações de emissão da BB Seguridade, da Vivo, do Bradesco e da Ambev, ressaltando a forte estrutura de capital dessas empresas e elevada liquidez em bolsa. Providencialmente, utilizamos o caixa disponível nas carteiras de renda variável com vistas a captura de retornos ao longo do semestre corrente.
Carteira internacional
Nos EUA o S&P500 registrou os primeiros sinais de exaustão com registro de realização de lucros (vendas de ações). Entendemos como natural o processo de ajuste dada as altas expressivas do índice nos últimos 12 meses. Aproveitamos o movimento para a realização alocações táticas, otimizando o resultado em ações, mas mantendo posições relevantes com ótica de longo prazo, buscando ações de empresas resilientes em uma economia desenvolvida.
Na renda fixa, mantivemos a postura de alongar os vencimentos dos títulos, em razão do fechamento da curva de juros, relativo ao possível corte de juros no decorrer do semestre.
Conclusão
As perspectivas quanto ao cenário internacional melhoraram com o início do corte de juros na Zona do Euro e a maior probabilidade de que os cortes juros nos EUA poderão ocorrer a partir de setembro de 2024, o que deve motivar a inversão do fluxo financeiro para bolsa brasileira e para os Emergentes. Cabe pontuar que os riscos associados aos eventos geopolíticos estão aumentados e, para tanto, seguimos monitorando possíveis alterações atípicas das variáveis macroeconômica.
A gestão segue priorizando a preservação de capital e o rigoroso controle de riscos. A disciplina na busca por ativos de qualidade com fundamentos fortes encontra-se preservada.
Renan S. Silva
Gestor, CGA